terça-feira, 5 de junho de 2012

A oração que faço


A oração que faço



a.j.chiavegato



Escrever sobre oração. Valha-me Deus, Nosso Senhor que se não me cuido, faço logo um livro, uma vez bom em teoria e sofrível em práticas. Simplificando o quanto me é possível, duas verdades regem minha experiência em fins de vida: primeiro, vivo em uma natureza e em um mundo livres, quer dizer, o que acontece não depende de Deus. Segundo, vivo nas mãos de Deus que não me empurra a nada, mas me ampara em tudo, ele que inventou o jeito de ser pai.

De acordo com a primeira verdade, não peço a Deus coisas para mim, ou para os que amo. Educação e hábito me levam a fazê-lo, mas não é de meu feitio. Vir-me uma doença, é lei da natureza e da vida, inexorável como a da gravidade. Se jogar um tijolo do alto de um prédio, vai cair na cabeça de alguém e o matar e nenhum anjo descabelado sairá voando, em ordens de Deus, para segurar o tijolo, porque alguém orou. Não peço a Deus que me cure, uma vez caber-me buscar a saúde através de meios que estão . Deus deu inteligência ao homem para encontrar soluções para seus males e tendo posto em seu coração uma sede insaciável de saber, definiu seu estilo de atuar em nossa vida. Vive-se mais hoje não porque mais se ora e Deus esteja trabalhando melhor em céus informatizados. Vive-se mais porque o homem usa mais a inteligência para descobrir os caminhos da longevidade. Antes, buscava-se curar pequenos males com oração leve. Doença grave, com reza brava, incertos os resultados. Hoje sabemos que remédios são mais eficazes que orações e até o papa tem plano de saúde, top de linha, Máster Mille. Minha irmã , menina, salvou-se de aguda brônquio-pneumonia, não pela inquestionável das orações de minha mãe, mas por graça do Dr. Fleming que acabara de inventar a penicilina. Em tempos de Álvares de Azevedo e Santa Terezinha, morria-se de tuberculose aos vinte anos, Deus não ouvindo as muitas orações. Pedir tudo, é atribuir-lhe responsabilidades que são nossas, como no caso da mãe chorando a morte do filho que com carro espatifou-se em árvore, caco cheio de uísque: por que Deus fez isso comigo?! Não adianta, minha amiga, Deus não faz nada em nosso lugar. É a dura verdade do sentido de nossa liberdade. Ah que gostaríamos fosse diferente, mas não é! É duro, mas vale a pena! De que outro jeito faríamos a experiência do poeta santista que cantava como é bom ser bom!? Não peço nada. Faço de minha parte o que posso. O que não posso, aceito, em resignadas paciências, certo de que vivo nas mãos de Deus que por mim nada faz, mas me ampara, sem que eu saiba, ou não veja como. Cuida de mim, como veste as flores e de comer a passarinhos, em escondidos silêncios de altas madrugadas.
Respeito os que fazem orações de muitos pedidos. Jesus mesmo ensinou a rogar ao Pai o pão de cada dia, o perdão de nossos erros e livrar-nos de todo mal. Também pratico esse tipo de oração, mas não muito. Quando o faço, é para me abrir com ele, sabendo-o presente, conferindo , como quem não quer nada. Respeito os que se fazem crianças que de tudo precisam e pedem, em exercício de grandes confianças. Mas, creio que se de progredir para outro jeito de orar que Jesus enalteceu: a oração sem palavras, abandono confiante nas mãos de Deus. Nada se diz, é-se apenas tranqüila aceitação de tudo. Exatamente como Jesus que em fraquezas de homem diante de sofrimento, suplicou em fundos desesperos: Pai, duro de agüentar, se possível, um jeito, afasta de mim este cálice. E se calou em esperas enquanto o Pai afagava-lhe o coração, passarinho doente, quentes ternuras insuflando-lhe o último alento para o abandono final: em tuas mãos entrego minha vida!

A oração sob este aspecto é exercício de aceitação da vida com seus acontecimentos, sejam quais forem e em sua base está a convicção de que em Deus, vivemos, nos movemos e somos. Quanto me diz respeito, sinto-me imerso nele. Penso, e ele está . Abro os olhos, e ele está . Sofro, e ele está . Nada lhe peço, e ele está . Faço o mal que não quero, e ele está , amigo, para o que der e vier. Vivo e ele está , até o momento que suas mãos sustentem minha última queda, suave cair de folha seca. Hoje, amigos, não sou mais que esse jeito simples de orar a Deus: respiro sua presença.

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